Estávamos a passear e pensámos “vamos à Fnac”. Claro que fomos logo para a secção da Banda Desenhada, onde ele se embrenhou nos comics e eu fiz a mesma coisa com o manga. Vi este volume enorme, capa dura, lindíssimo. “Tem defeito, custa 10€” Claro que o vou levar! E, diga-se de passagem, não cheguei a encontrar o defeito.
Isto é uma colecção de histórias curtas, como eu gosto, encabeçadas (ou será que é no fim?) por uma entrevista intimista à autora e um pequeno artigo sobre a origem do género shoujo no manga, lá nos anos 70. Moto Hagio foi da geração fundadora deste género e na entrevista compreendemos as dificuldades e os entraves da indústria, liderada por homens de meia idade, durante a concepção e nascimento do género.
As histórias são muito variadas, sendo as minhas preferidas Hanshin e Iguana Girl. A primeira trata de duas gémeas siamesas, uma feia e inteligente e a outra muito bonita mas atrasada mental. Fala na perspectiva da irmã feia e sobre a sua dor por não ser aceite e por ter outra pessoa à qual é sempre comparada, apesar de ela acabar por se tornar nessa pessoa no final (mais não digo, porque o final é mesmo extraordinário). A segunda é sobre uma rapariga que é vista como uma iguana pela mãe e a sua luta diária contra o sentimento de inferioridade que tem em relação à irmã. Como podem ver, há nestas histórias um tema recorrente, que é o dos irmãos e das famílias que não aceitam os filhos tal como eles são. Isto parece ser algo pessoal da autora, confirmado por alguns trechos da entrevista em que ela fala sobre as dificuldades e incompatibilidades que tem com a mãe.
As outras histórias são muito variadas, sendo as primeiras muito avant-garde para a época, no que respeita aos sentimentos das personagens. Existe uma história a cores que é ficção científica com um toque de espiritualidade. Aparentemente a autora foi uma das revolucionárias da ficção científica em modelo manga, pois a maior parte das suas histórias mais longas são passadas em universos futuristas e fantásticos.
No entanto apenas aquelas duas histórias me moveram verdadeiramente. Além disso, não notei nenhuma evolução estilística ao longo de quase 40 anos, apesar de se ver evolução no uso das técnicas. E hoje em dia o estilo dos 70s acaba por não funcionar bem em comparação com os “designs” dos artistas mais jovens que vieram substituir esta geração.
De uma forma ou de outra, é um estudo muito interessante que nos revela bastantes coisas sobre a história do manga e como se fazia manga há tanto tempo atrás. Se encontrarem este volume, recomendo. Mesmo que não tenham o meu golpe de sorte de o encontrar “com defeito”.
Escrito por: Carol Louve