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[Guia] : 4 mitos sobre o japonês

Aprender sobre a língua e a cultura japonesas é absolutamente fundamental, e nunca será de mais insistir nisso. O vosso bem-estar, o sucesso do vosso trabalho, a possibilidade de se divertirem, tudo mas mesmo tudo depende do quanto “por dentro” estão, do quanto dominam o que é saber-ser e saber-estar na sociedade japonesa. Não se iludam, ser conveniente em cada situação é muito complicado para um ocidental, e diria mesmo que é totalmente impossível para quem não teve aulas formais.

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Por isso, se ainda não fizeram um curso de língua e cultura japonesa em que se tenham aplicado, levado mesmo a sério e chegado pelo menos ao A2, nem vale a pena esperarem desfrutar do Japão depois de lá porem os pés (mais uma vez, recordo, estou a considerar que vão fora de contexto turístico e por estadias prolongadas).
A partir daqui vou desmontar alguns mitos e partilhar algumas experiências do que foi a minha preparação:

Primeiro mito: “Mas eu vejo anime desde os 6 anos, até já entendo japonês…”
A aprendizagem superficial de algumas expressões idiomáticas japonesas ou de conversação por via de animação ou filmes não corresponde à língua japonesa corrente, pelo que a ideia de “aprender japonês com anime” é totalmente falsa. Para além disso depende muito de para onde vão. Na região de Kansai por exemplo, da qual a cidade maior é Osaka, fala-se um dialecto específico. Se só tiverem contactado com o japonês “de Tóquio” não vão perceber grande parte. Todas as regiões no interior de cada ilha têm dialectos locais – embora os jornais, televisão e rádio falem o japonês padrão – e por isso os primeiros meses podem ser de re-aprendizagem.

Mesmo se tiverem sido alunos exemplares de língua japonesa irão constatar que a oralidade do dia-a-dia é menos formal do que a versão de japonês que vos ensinaram. Isso não é um problema (serão extra-educados) mas terão de fazer adaptações. Em suma, a língua japonesa é complexa e em grande parte dúbia (isso é uma vantagem como perceberão mais tarde, pois permite desviarem-se de assuntos inconvenientes, fazer piadas, acrescentar um toque de poesia, e maior criatividade de comunicação) mas vale a pena considerarem começar a estudar dois anos antes de irem para o Japão.

Segundo mito: “Eu tenho um namorado japonês / uma namorada japonesa…”
Esta é uma situação em que há vantagens e desvantagens (e só vou falar das linguísticas). De facto o contacto directo com um falante nativo vai ajudar a aprender qualquer língua estrangeira. Se acrescentarmos a isso a curiosidade mútua, o carinho e a paciência de estarem a aprender com alguém que gosta de vós pode ser mesmo o contexto ideal. No entanto, se forem totalmente desconhecedores de japonês irão ter a tendência de memorizar as expressões, cadências rítmicas, tom e tudo o mais que aquela pessoa faz. Mas, e considerando que o vosso namorado/namorada é do sexo oposto (nada contra gays e lesbo, é só um exemplo), então vocês vão estar a memorizar o japonês de como fala uma pessoa desse sexo, não do vosso. Reparem, na sociedade japonesa os homens e as mulheres têm maneiras diferentes de falar, ao ponto de terem diferente vocabulário!

Por isso se forem um rapaz correm o risco de vir a falar “japonês de menina”, e se forem uma rapariga correm o risco de falar com um tom extraordinariamente deselegante para o sexo feminino (ou serem confundidas com um membro de gangue). Acontece um problema semelhante com pessoas que são descendentes de japoneses mas nasceram noutro país (sobretudo Brasil) e que aprenderam a falar algum japonês com os avós. Quando essas pessoas chegam no Japão sofrem alguma chacota dos colegas pois aos ouvidos dos japoneses é como se estivessem a falar cheios de “voçamercê”, isto é, uma versão da língua extremamente antiquada!

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Terceiro Mito: “Sou óptimo com hiragama, katakana e vocabulário, até consigo conversar!”
E? Na verdade o iragana e o katakana são apenas residuais na vida do dia-a-dia no Japão. O que interessa mesmo são os kanji. Sim, os símbolos complicados! Se vocês forem um desastre em kanji não vão poder comprar artigos no supermercado, compreender direcções num mapa, preencher impressos, saber o nome dos vossos amigos/colegas de trabalho, entender um menu para pedirem comida (as montras com comida de plástico existem apenas nas cidades meeeeeesmo grandes, e não são os melhores sítios para comer). Com certeza que vão conseguir conversar, e isso já é muito importante, mas sem os kanjis vão ser basicamente analfabetos.

A boa notícia é que o olho humano aprende a decifrar e menorizar padrões muito rapidamente, sobretudo quando estão em todo o lado à nossa volta e nos são apresentados em contexto. Ao final de 3 meses no Japão já conseguia ler pedacinhos de notícias! Mas, claro, com a falta de prática a coisa também se esquece rapidamente…

Quarto Mito: “Mas eu não sou nada assim, sou pró em japonês, por isso está tudo resolvido!”
E como são os modos? A paciência, a postura permanentemente humilde (quase curvada), a vénia sempre pronta a fazer-se, a concentração, a capacidade de sorrir estando nervoso e de fazer uma piada no momento apropriado (evitando fazê-la quando cairia no ridículo)? Como se treina isso? Não há uma resposta fácil, e nem eu poderia dar uma receita infalível porque cometi muitos erros. O que posso dizer é que, mesmo o maior conhecedor de língua japonesa pode ser muito rude, inapropriado, e deixar uma marca negativa nas pessoas com quem contacta (eu vi isso da parte de alguns estrangeiros).

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Por outro lado, um desconhecedor de japonês extremamente sensível e ciente dos outros pode relacionar-se simpaticamente com variadas pessoas e resolver muitas situações problemáticas com esse dom. A complexidade da maneira de proceder dos japoneses é muitas vezes apelidada de “incompreensível”, “críptica” ou mesmo de “ilógica”, no entanto o sentido que lhe está por detrás depende de coisas como quem tinha precedência naquele momento, como era mais delicado e menos intrusivo para todos resolver aquela situação, de que modo é que a ocasião se tornava mais aprazível (mesmo que menos eficiente).

E estamos a falar de coisas tão simples como a relação entre as pessoas no entrar e sair do elevador, só para dar um exemplo. Sem dúvida que só quem já esteve no Japão é que vai entender este quarto mito, mas a verdade é: não basta saber falar japonês, é mesmo preciso pensar como um japonês para se “encaixarem” na sociedade. Isso eventualmente treina-se, mas depende da vossa disponibilidade interior para abraçarem uma cultura densa e sem termos de comparação com a nossa.

No próximo artigo falarei de cartões de visita ou “meishi”, uma das coisas que devem fazer com antecedência para levarem convosco para o Japão. Na verdade a motivação de cada pessoa e o que a leva ao Japão exige necessariamente preparativos diferentes… Mas aqui vou tentar dar conselhos que se adaptam a todos, ou que eventualmente vos suscitem mais perguntas (que podem colocar no website!).

Ganbate!

Escrito por: Inês Carvalho Matos

5 comments
  1. Kamikaze

    Vendo a natureza do meu ser (que já vem desde o berço) acho que enquadro bem no “típico japonês” sensível, bem educado e reservado. Só me falta mesmo saber a língua; seria um enorme prazer aprendê-a XD

      1. Inês Matos

        Peço desculpa se o tom ofendeu, não era o propósito. Tentei ser directa porque a mensagem “vai correr tudo bem” é a mais fácil e difundida, tendo levado a muitas desilusões. Pareceu-me mais importante dar a maior informação possível, em vez de explicar o porquê de cada coisa. Pelos vistos deveria ter dividido o conteúdo do artigo em mais entradas, para não dar essa impressão e perceber-se a gravidade das consequências do que aqui falo. Em todo o caso, obrigado pelo vosso comentário, vou ter isso em conta. OBS: já tinha escrito esta resposta à muito tempo, mas não sei porquê desapareceu do site, por isso vim cá escrever outra vez.

  2. Mais um chato na rede

    KKK

    Já deu para perceber que eu vou fazer novos desafetos fácil quando for para lá. Nem tenho paciência com a falsidade do brasileiro quanto mais em uma cultura em que falsidade nem é palavrão.

    Ainda bem que não estou aprendendo japonês para conhecer novas pessoas e me relacionar com elas, somente para ler mesmo.

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