Lembro-me que quando era mais novo arranjavamos todos os estratagemas para que os nossos professores e pais não descobrissem as nossas aventuras mais recambolescas por isso uma das formas de esconder era usarmos a linguagem dos pês nas conversas entre os nossos amigos. Também no Japão durante a década de 80, as Gyaru criaram uma linguagem para comunicarem entre elas.
Recuando um bocado na história, a linguagem japonesa está dividida em três sistemas de escrita: o complicado sistema de caracteres kanji, e dois alfabetos fonéticos: o hiragana e o katakana.
Há uma longa tradição no contributo da mulher na evolução da linguagem no Japão. Já no período Heian (794-1185) as jovens mulheres eram educadas a “fugirem” das duras linhas dos caracteres kanji e era-lhes ensinado a lerem e a escreverem as delicadas e femininas curvas do hiragana. Por este motivo, o hiragana foi chamado de onnade (mão da mulher). É também nesta altura que foi escrito o romance de Genji, consideradopor muitos o primeiro romance da história da literatura escrito por Murasaki Shikibu.
No final dos anos 70 e inícios dos anos 80, quando no Japão tudo era “fofinho” e cor-de-rosa, também a caligrafia das jovens japonesas tornava-se mais redondinha para acompanhar a estética da altura. Os caracteres hiragana ficavam mais redondos, eram adornados com corações e símbolos kawaii. Esta forma de escrita transformou-se na década seguinte na denominada gyaru moji (letras de menina, numa tradução “selvagem”) que foi criada e abusivamente utilizada pelas colegiais, onde além do hiragana eram incluídos o alfabeto romano, grego, círilico de forma a criarem graficamente emoções, como este exemplo (^o^).
Nos anos noventa, institui-se entre a comunidade feminina jovem não só esta “nova” forma de escrita bem como um novo dialecto a que deram o nome de Gyaru-go. Uma lingua fluída, com criação de novas palavras usando para isso palavras curtas e acrónimos (usando o alfabeto romano), fazendo também a apropriação de palavras traduzidas do inglês ou ainda usando os prefixos como o cho (ultra).
Além das palavras também existiam algumas expressões e que eram denominadas por “Ryuukougo” (流行語) que significa “Palavras na moda”, e que poderiamos equiparar ao nosso “calão”.
Deixamos alguns exemplos de palavras:
Agepoyo: Estar excitado, energético, alegre, contente (uma das expressões mais popular entre as gyaru).
Buya: Shibuya
Cho: Super (muito utilizado em expressões do tipo Cho beri gu – muito muito bom)
GHQ: Ir para casa depressa (acrónimo da frase inglesa Going Home Quickly)
Makuru: Ir comer ao MacDonalds (abreviatura da frase japonesa Makku ni suru)
No puro: Sem problema ( do inglês No problem)
Okeru: Ir ao karaoke (da frase japonesa Karaoke ni iku)
Assim as jovens japonesas conseguiam falar em “código” sem que os professores e os adultos percebessem, apesar de terem sido criados dicionários para facilitar a vida aos adultos.
Escrito por: Fernando Ferreira