Um dos nomes mais importantes do mangá de terror foi Kazuo Umezu. A sua importância foi tal que muitos críticos e estudiosos do fenómeno mangá o consideraram o grande “Deus do Mangá de Terror”.
Nascido na província de Wakayama em Setembro de 1936, Umezu ainda em criança foi viver para a região montanhosa de Gojō, na província de Nara. Desde tenra idade que foi incentivado a desenhar pela sua mãe enquanto que o seu pai lhe contava histórias de fantasmas, yokais e de lendas do folclore tradicional japonês. Segundo consta, a sua inspiração maior foi o grande Osamu Tezuka e a obra Shin Takarajima, isto por volta dos 12/14 anos na escola onde tinha com outros colegas de turma um clube de desenho chamado “Kaiman Club”.
Aos 18 anos, publica o seu primeiro manga “Mori no Kyōdai” baseado no conto de fadas Hansel e Gretel com a editora Kashihon Tomo Book. Mas foi por pouco tempo que Kazuo continuar neste tipo de mangá. Uns anos depois descobre o movimento Gekiga e decide abraçar esta demografia dando-lhe mais liberdade criativa e estética. Também assim tinha mais liberdade para criar os seus mangás em vez de estar preso a uma série. O que não ficou para trás foi o seu gosto de incluir elementos paranormais nas suas histórias. É também nesta altura que começa a trabalhar em shōjo manga publicando na revista Shōjo Book e na antologia Kashi-hon Niji.
É já nos anos 60 na capital japonesa que Umezu desenvolve o seu estilo, que misturava a estética do manga shōjo com imagens de terror grotescos. Esta estética faz com que o mangá shoujo comece a ser visto de outra forma. Mangás de terror como Nekome no Shōjo e Reptilia tornaram-se um sucesso na revista comercial de mangá shōjo Shōjo Friend na década de 1960.
No final da década de 1960, começa também a publicar em revistas de manga shōnen e muda de editora, da Kodansha para a Shogakukan. Nesta sua nova editora o seu novo “chefe” pede-lhe para tentar desenhar algo diferente de manga de terror. É neste período que Umezu torna-se um autor bem estabelecido. Em 1974, ganha o 20º Prémio Shogakukan Manga pela sua série The Drifting Classroom, um mangá que relata a vida de uma escola onde os seus alunos e professores são teletransportados para um universo pós-apocalíptico alternativo.
A carreira de Umezu estava em alta nos anos 70, torna-se uma figura pública como autor de mangá, mas também como cantor/músico. Ele grava vários temas inspirados nos seus mangás de terror e chega mesmo a gravar um álbum intitulado Yami no Album. É nesta altura que nasce o famoso gesto com a mão “Gwash” e que rapidamente se torna a marca registada de Umezu.
É também durante os anos 70 e início dos anos 80 que publica o mangá de comédia Makoto-chan, na famosa revista Weekly Shōnen Sunday, e que mais uma vez é um sucesso de vendas. Nas décadas de 1980 e 1990, concentra-se em mangas de ficção científica retratando um futuro próximo, destacam-se os mangás: My Name Is Shingo e Fourteen.
Em 1995, retira-se do mundo editorial devido a uma tendinite após terminar o manga 14-sai. Durante esta pausa torna-se uma figura ainda mais pública, aparecendo regularmente na TV com uma camisola às riscas vermelhas e brancas. Mas não era só a sua camisola que era às riscas, Umezu também ficou famoso pela arquitetura da sua casa em Kichijōji, inspirada na sua série Makoto-chan. Em 2011, lançou um segundo álbum musical com canções da sua própria autoria.
Sete anos mais tarde é galardoado com o Prémio de Herança no Festival Internacional de Banda Desenhada de Angoulême pela tradução francesa de My Name Is Shingo. Este foi o segundo prémio que lhe foi atribuído ao longo da sua carreira e Umezu já tinha ficado insatisfeito com o reconhecimento que obteve pelo seu trabalho. O prémio motivou-o a voltar a trabalhar e produziu uma série de 101 pinturas baseadas em My Name Is Shingo, que foram expostas pela primeira vez em 2022 e foram o seu primeiro trabalho inédito em 27 anos.
Ao longo dos anos as suas obras inspiraram uma nova geração de artistas de manga de terror. Junji Ito, Toru Yamazaki e Minetarō Mochizuki citam-no como uma das suas maiores influências e Kanako Inuki iniciou a sua carreira numa revista por ele compilada. A autora Rumiko Takahashi trabalhou como assistente para ele, no período que ele estava a desenhar a série Makoto-chan. A sua reputação valeu-lhe o apelido de “deus do manga de terror” (ホラーまんがの神様) nos meios de comunicação social japoneses.
Em 2019, Umezu recebeu o prémio de Comissário para os Assuntos Culturais da Agência para os Assuntos Culturais. É um prémio para “aqueles que se destacaram em actividades artísticas e culturais”. Raramente é concedido a pessoas da indústria da manga.
Em Julho de 2024, Umezu foi hospitalizado após ter desmaiado na sua casa em Kichijōji, na capital japonesa. A 5 de Novembro de 2024, Shogakukan anunciou que Umezu morreu a 28 de outubro, aos 88 anos.
Escrito por: Fernando Ferreira