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Nausicaä

O premiado Hayao Miyazaki tem como peça central das suas obras gráficas, uma longa e complexa série editada seriada na Animage, e cuja criação se estendeu ao longo de 13 anos (entre 1982 e 1995). Precedendo, e notavelmente expandindo, o universo de ficção cientifica mostrado no filme homónimo de 1984, “Kaze no Tani no Naushika” lida com os temas mais recorrentes do universo deste autor – a guerra em todas as vertentes, as questões ambientais e o confronto da heroína face ao que como indivíduo, pode fazer.

O universo de Nausicaä começa após um cataclismo 1000 anos atrás, causado pela própria civilização industrial, chamado “os sete dias do fogo” e sob o qual muito do conhecimento tecnológico desapareceu. A heroína, princesa do pequeno reino fronteiriço do Vale do Vento, vive na beira de uma floresta de fungos habitada por gigantescos insectos ao qual foi dado o nome de Mar de Corrupção. Dotada de uma notável empatia com os animais e plantas, é compelida por estes, assim como pelos tratados entre o seu reino e o reino vizinho de Torkumekia, a seguir para sul na “gunship” do reino em direcção a uma guerra, tomando o lugar do seu pai, afligido por uma doença incurável.

O manga impressiona pela sua capacidade de abranger uma quantidade considerável de informação, colocando ao nosso alcance um mundo altamente complexo – intriga politica, esquemas sociais, mecânica, biologia, um pouco de exoterismo e obviamente as motivações pessoas das pessoas, tudo é abrangido. Simultaneamente, Miyazaki revela-se um mestre em não moralizar o enredo, dando cartas constantemente e colocando as próprias decisões da heroína em causa, eliminado a noção de bons e maus da fita. Esta mestria, aliada por vezes a um humor peculiar, torna a progressão nesta obra de grandes dimensões bastante suave.

Dada a duração em termos temporais que esta obra demorou, e as alterações que o próprio autor logrou fazer para a versão encadernada, a qualidade gráfica é notavelmente constante, apresentando-nos os já clássicos desenhos mecânicos do autor e a sua fascinação pela acção aérea. Aliás, engane-se quem acha que Hayao é um ilustrador de histórias infantis, e a sua fascinação pelo exército puramente juvenil – as suas ilustrações da guerra são cruas e de uma solidez incomparável, e as movimentações de tropas são realistas e planeadas. Mais do que uma vez, a estratégia militar toma as rédeas, e oferece-nos alguns dos momentos mais memoráveis da série.

Uma das mais acessível versões deste manga na Europa é a boxset em inglês da Viz Graphics Novels, que engloba os 7 volumes da versão original em quatro volumes de capa mole (sem capa exterior) numa caixa de cartão ilustrada. A qualidade do papel é boa o suficiente, e embora não agrade aos puristas a inversão das folhas (o livro corre da esquerda para a direita, no formato clássico ocidental), a adaptação é de alto gabarito, levada a cabo por alguns dos melhores profissionais do campo. Infelizmente á “Perfect Collection” (nome da boxset e aos livros individuais desta) faltam as páginas a aguarela dos 7 volumes individuais originais editados pela Viz (agora raros de arranjar), o que é uma pena.

“Nausicaä of the Valley of the Wind” revela-se uma agradável leitura, por vezes fascinante e profunda como poucos livros do género logram ser. Há um senão – aquando da conversão da série para as encadernações, Miyasaki removeu os elementos entre capítulos da Animage que recapitulavam os acontecimentos anteriores. Com isto evitou pausas estranhas na acção, mas é fácil ficar perdido mais para o final do livro, quando as coisas se começam a acumular. Nada que uma segunda leitura não resolva, coisa que se faz com muito agrado.

Que posso dizer mais senão lamentar os ouvidos moucos que as editoras portuguesas fazem a um título de reputação invejável como este, e que por mil e uma razões, tardam em nos aliciar com material de qualidade. Ficam aqui os desejos de melhores dias…

Autor:Nuno Sarmento

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