Toyohara Kunichika nasceu no bairro de Kyobashi, no seio da zona mercantil e artesã que rodeava o castelo de Edo, com o nome de Yasohachi Oshima. O seu pai era proprietário de uma casa de banhos. Ainda na infância mudou o seu nome para Yasohachi Arakawa, por iniciativa do seu irmão mais velho, que tomou assim o nome de família do seu avô materno, proprietário de uma casa de chá. Kunichika é pois um verdadeiro filho do “mundo flutuante”, origem que, a avaliar pela sua fama de boémio, não desmereceu. Dele afirmou um contemporâneo que “gravuras, teatros e bebidas são toda a sua vida e mais não quer”.
Kunichika tornou-se um discípulo de Chikanobu aos onze ou doze anos e, aos treze, entrou para o estúdio de Kunisada. Foi a partir do nome destes seus dois mestres que Kunichika recebeu o mon (ou nome de artista) por que é conhecido. A primeira obra que dele conhecemos data de 1853.
Kunichika foi um artista bastante apreciado no seu tempo, embora nunca tivesse conhecido o sucesso e reconhecimento do seu mestre Kunisada ou Yoshitoshi viria a conseguir no final da sua vida. Foi conhecido sobretudo pelas estampas de actores (yakusha-e), embora também tivesse produzido estampas de retratos femininos e algumas estampas de paisagens e de cenas históricas. Em 1867 foi escolhido para contribuir para a participação nipónica na Feira Mundial de Paris, um dos grandes marcos da divulgação das estampas Ukiyo-e na Europa.
Kunichika é geralmente considerado o primeiro artista que explorou todas as potencialidades do tríptico como formato próprio, por oposição à mera justaposição de três estampas independentes. Esta atribuição não pode, na verdade, ser confirmada pelos factos, uma vez que outros artistas, em particular Kuniyoshi, tinham já desenvolvido composições “unificadas” anteriormente. No entanto Kunichika é, sem dúvida, um dos mestres deste formato.
Kunichika foi um dos mestres Ukiyo-e que mais e melhor utilizou as novas tintas artificiais importadas da Alemanha, com destaque para os tons fortes vermelho, azul e púrpura. Esta predilecção levou a que a sua obra fosse menosprezada pelos críticos, sobretudo durante o século XX, que a consideravam vulgar e a associavam à decadência da arte Ukiyo-e.
No entanto Kunichika é, sem dúvida, juntamente com Yoshitoshi, um dos seus últimos grandes mestres. Ele é porém aquele que, dos dois, mais se liga à tradição Ukiyo-e. De entre os seus discípulos devemos destacar Yoshu Chikanobu, quase seu contemporâneo, que marca já a transição para a nova sensibilidade que caracterizaria a evolução para o estilo Shin-Hanga.
Seguindo uma velha tradição japonesa Kunichika compôs para si próprio um poema fúnebre, em que escreve “Estando farto de pintar retratos das pessoas deste mundo, irei pintar retratos dos demónios e do Rei do Inferno”.
Autor:Manuel Paias