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Kemono Zume

Será uma redundância dizer que a nova obra de Masaaki Yuasa é bizarramente estranha e com um espectacular estilo único sem qualquer ligação com a actual anime. De resto Yuasa, um dos mais influentes e inovadores criadores da animação japonesa actual, nunca conseguiu estar ligado a uma produção que podesse ser facimente rotulada.

Basta pensar no seu envolvimento ‘menos directo’ em Noiseman Sound Insect (1997) ou Cat Soup (2003) ou nas suas próprias realizações, como Mind Game (2004) e no episódio Hamaji’s Resurrection, da série The Hakkenden (1994), ainda hoje vistas como das obras mais influentes da actual Anime para entender que a obra de Yuasa projecta já o que será o futuro próximo da anime, sem concessões estéticas nem clichés sobre-usados e sem possivel comparação com a animação mainstream.

Kemono Zume, a nova série realizada por Yuasa, produzida pelos não menos influentes Madhouse Studios, é claramente uma evolução no estilo deste autor, com os devaneios visuais obssessivos que se tornaram quase uma regra na obra do autor, mas agora com um estilo expressionista altamente absorvente, que não dá descanço aos espectadores.

Traduzido como “As Garras da Besta” (ou “As Garras do Monstro”), Kemono Zume conta a história da luta entre um limitado grupo secreto de samurais contemporâneos (os Kifuken) que lutam contra uma raça de aparentemente míticos monstros canibais (os Shokujinki) que se escondem em corpos humanos, revelado-se apenas quando sentem lúxuria. A história desenvolve-se quando Toshihiko, filho da cabeça do clan dos Kifuken se apaixona por Yuka, uma aparentemente humana com uma forte linha de sangue Shokujinki, levando-o a rebelar-se contra o clã.

Se através desta pequena descrição Kemono Zume aparenta cair em alguns dos clichés da animação que retrata Yōkai e extremas transformações corporais, a forma surreal como Yuasa constroí esta bizarra história usando como tema centrais os impulsos humanos mais escondidos catalogados pela psicanálise, faz desta série uma das mais frescas propostas desta season de animação made in Japan, mostrando como esta história de amor singular consegue revelar os mais temíveis segredos do psique humana.

E se a temática é de facto rica em simbolismo (uma marca deste realizador), com uma construção não-linear das personagens, que parecem ocultar factos (que vão surgindo com alguma surpresa durante a série) é a técnica de animação, brutalmente expressionista, que partindo da influência da pintura deste movimento artístico (pessoalmente parece-me que Oskar Kokoschka parece ser, entre outros, uma das influências gráficas desta série), gera uma magnífica mezcla gráfica, que uma complexa mistura traços esquizófrenicos com fotogramas coloridos à mão, fazendo cada segundo de imagem uma ilustração animada que se junta na perfeição aos desejos complexos das personagens.

A adicionar a esta mestria gráfica, a banda sonora, melancólica e ‘urbanamente cool’ (composta por Megumi Wakakusa) eleva esta série à perfeição, complementada pelo tema de abertura “Over Blues” dos hipersters Katteni Shiyagare, um dos combos mais interessantes do actual revivalismo swing, que conseguem acrescentar ainda mais interesse a esta obra-prima.

Kemono Zume é uma daquelas séries que nega aqueles que (ainda) afirmam que a actual animação japonesa está presa num perpetúo ciclo de clichés e que não consegue ser inovadora. Altamente recomendável, esta é uma das mais singulares e interessante séries dos últimos anos.

Nuno Barradas, autor do blog (http://bitlogger.blogspot.com/) onde podem ser lidas ideias, visões, audições e navegações sobre o Japão e não só.

Autor:Nuno Barradas

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