Casos como estes são raros em Portugal, por isso vale a pena falar deles e conhecê-los. O ClubOtaku foi em busca de toda a história que está por detrás do mais recente manga “made in Portugal” criado por Mitsu e Led (nomes de guerra) baseado na triologia “As Sete Cores de Oníris” da autoria de Rita Vilela publicado em 2008, 2009 e 2010 respectivamente. Quatro anos passados nasce o primeiro volume em banda desenhada.
Podem falar um pouco sobre o vosso início neste mundo do manga e de como nasceu esta paixão por esta arte?
Mitsu: Annyeong, é um prazer estar aqui.
O meu início nesta arte veio desde os meus tempos da primária. Desde muito pequena gostava muito de desenhos animados e graças a eles comecei a desenhar.
Comecei pelo Sonic, Mickey, Sailor Moon e mais tarde o Dragon Ball. Tanto como os desenhos animados também era virada para os vídeo jogos.
Desde cedo conseguia distinguir os desenhos animados orientais dos ocidentais. Para mim sim, os orientais é que eram desenhos animados, pois esse estilo de desenho e animação eram muito inspiradores. Assim que surgiam novidades relacionadas com essa cultura, abraçava-a com muito carinho. E até hoje não a largo.
Led: A paixão por esta arte nasceu ainda nos tempos de escola. Não me identificava com nenhuma das coisas que estavam na moda na altura, e apesar de já ser “crescida”, ainda via desenhos animados. Como sempre fui fascinada pela cultura japonesa, experimentei ver anime. Consequentemente, e porque gosto muito de ler, peguei nas séries manga dos animes que via, e acabei por ficar viciada. Hoje em dia, tenho as prateleiras cheias de livros e sonho de ir ao Japão.
Criaram uma história com base na triologia escrita pela Rita Vilela. Já conheciam os livros antes de terem vos convidado para desenhá-los? Como decorreu esse processo?
Mitsu: Honestamente, não leio muitos livros. E só conheci a história a partir do workshop com o João Mascarenhas. Sinto-me embaraçada, desculpa, Rita. Nesse mesmo workshop fui apanhada de surpresa não estava à espera de ser convidada para fazer uma manga com uma autora. Gostei muito da ideia e alinhei. Obrigada ao João e à Rita pela oportunidade. Foi uma honra conhecer-vos. ^^
Led: Sim, conhecia, e de uma forma muito engraçada, por acaso. Trabalhava numa livraria em 2008, e fui encarregada pela responsável de loja de fazer uma exposição gira para uma série nova de livros. Peguei nuns dragões de papel e pendurei-os no tecto. Diverti-me imenso a montar aquilo que, no fim de contas, era para As Sete Cores de Oníris e desde então nunca mais me esqueci disso. Vim para este mundo graças ao André Oliveira, que já mais tarde foi meu colega de trabalho, e que me perguntou se eu não queria experimentar pintar umas pranchas para um projecto novo. Quando descobri para o que era, nem quis acreditar na coincidência. Felizmente, a Rita Vilela gostou muito da minha prestação e assim ficámos.
Na criação do manga, quais foram os vossos principais cuidados? E os pedidos da autora
Mitsu: Bem, no início tive que ter bem em atenção a descrição de cada personagem dada pela autora. Queria fazer um bom trabalho, então tentei seguir todos os passos dados pela autora e guionista. Assim, como tinha que fazer as pranchas de raiz, esboçava e enviava aos colegas de trabalho e seguia as suas opiniões. Na leitura do livro e juntamente com o guião, conseguia imaginar logo como seriam as ações e como eram cada personagem e cenário. A criação dos personagens foi a primeira etapa e a mais comovente, pois criei cada ser do mundo da Rita com muito carinho. Imaginei o mundo com uma mistura de Final Fantasy, Senhor do Anéis e em criaturas exóticas. Fiquei muito impressionada com os gostos da Rita, deixavam-me muito á vontade e livre no criar dos desenhos. A Led fez um ótimo trabalho, ela conseguiu desvendar cada detalhe e torná-lo notável. Este manga é sim fantástico, assim como o seu mundo. Trabalhar com esta equipa é um sonho!
Led: Principalmente, procurei a todo o instante que a parte que me competia, (preenchimento a preto e branco) estivesse sempre com a resolução correta, para não parecer pintura de “folha de jornal”. Ainda tive que ter também muita atenção aos desenhos que me chegavam da Mitsu, para corresponder ao que ela tinha imaginado. Sendo a última parte da equipa, a responsabilidade é muito grande para seguir as linhas de pensamento de quem vem antes. Foi por isso que dei sempre particular atenção às sugestões da Rita Vilela, pois sentia-me como se ela me tivesse dado o seu “filho” para as mãos e me pedisse para o vestir. Faz-me sentir muito feliz estar a transformar o seu sonho, para além do meu e da Mitsu, em realidade.
O número de páginas do 7 Cores de Oníris é considerável. Quanto tempo demoraram a desenhar e colorir?
Mitsu: Como primeiro projeto de manga à séria, o tempo que demorou penso que foi razoável. Demoramos cerca de 2 anos, pois surgiram algumas complicações, pessoais e profissionais. Por vezes era chato não conseguir completar um “X” de pranchas num determinado tempo, ficava frustrada quando apareciam problemas e outras dificuldades e tinha que deixar o trabalho de lado. Entretanto, com a ajuda do calendário, foi mais fácil completar os objetivos, e assim que tinha mais tempo livre aproveitava para fazer uma maratona. O último ano foi bombástico com a ansiedade de publicar o livro a tempo, mas consegui completar os objetivos com antecedência. Nem acredito que o consegui fazer, e estou pronta para mais um.
Led: Infelizmente, este projeto teve uma duração de cerca de dois anos. Surgiram diversas dificuldades ao longo do tempo, tanto pessoais como profissionais, que muitas vezes, ficávamos sem saber se iríamos conseguir lançar As Sete Cores de Oníris – A Grande Aventura ou não. Até que chegámos a um ponto em que dissemos as três: vamos acabar isto, bolas, e depois logo se vê. Fizemos um calendário, e no que toca à minha parte, fazia cerca de quatro páginas por semana, para conjugar com o trabalho. Depois estive desempregada, o que na altura veio mesmo a calhar, pois consegui avançar mais rapidamente.
Além deste título, têm outros trabalhos publicados?
Mitsu: Sim, um, num fanzine, feito num workshop de fanzines na Etic. Era um manga curto de 4 páginas.
Led: Tive um pequeno trabalho publicado numa revista de BD chamada Zona, na edição Zona Nippon 1. O autor pediu-me que passasse algumas pranchas de cores para gradiente de preto e branco, para poder publicar o seu trabalho na revista, pois era obrigatório que não se usasse cor. A história chamava-se “Nomad”.
Quais são as vossas maiores influências?
Mitsu: Eish, influências…tenho muitas, vou falar das mais importantes. O meu mangaka favorito é Takehiko Inoue, com o manga Vagabond. Esse artista é um sonho, tudo muito pormenorizado e detalhado, os cenários, as personagens, é a minha maior influência. Também tenho muito carinho pelo Gosho Aoyama, com o manga e anime Yaiba. Estes dois artistas inspiraram-me muito. Mas a minha maior influência são os sonhos, os sonhos inspiram-me muito, cada noite várias histórias diferentes que se interligam entre si de uma maneira muito subtil. Gosto muito de sonhar e a música ajuda no processo. Sonho tanto a dormir como acordada. Gostaria de viver os meus sonhos e com a Rita muitos deles são passados cá para fora e tornados realidade.
Led: É difícil dizer, pois não dou muita importância a isso. Creio que uma pessoa vai sempre apanhando uma coisa aqui e outra ali, e na sua cabeça acaba por aglutinar tudo e ter sempre o seu próprio método. Às vezes sinto-me influenciada por filmes, pessoas, padrões de tecidos, cores, ou até mesmo pela própria vida. Considero o próprio mundo em si a minha influência, as texturas das árvores, as ondas do rio… Sou é preguiçosa e acabo por deixar tudo dentro da cabeça em vez de pegar nas canetas. Posso dizer que sou da geração do Dragon Ball, e isso deixou em mim uma marca muito forte. Em termos mais populares, adoro Fullmetal Alchemist e Naruto.
Cada vez mais há mais fãs da banda desenhada japonesa em Portugal, não só a ler como a desenhar. Como vêem o panorama nacional em relação a este fenómeno?
Mitsu: Em pequena eu era dos poucos casos com gosto por essa cultura. Mas com o passar dos anos e com muita influência de animes na televisão e agora com o mundo online, vejo mais atenção e popularidade por este mundo. Uma das ajudas aos amantes de manga e anime foi a criação de eventos pelo país. O meu primeiro evento foi o Anime Photoshoot # 06 em 2006, nessa altura fiz um pseudo cosplay de Noodle da banda Gorillaz e éramos uns poucos. E agora até vejo um grande número de pessoas a assistir a esse tipo de eventos e encontros. Com os desenhos vejo o mesmo progresso. Ultimamente participo numa banca de 4 artistas, a Fantastic Banca, e vejo muitas pessoas interessadas nos nossos desenhos e que até divulgam os seus personagens. As bancas de artistas nestes eventos têm progredido muito e espero que esse interesse se venha a prolongar 🙂
Led: Faz-me sentir muito feliz que assim seja, que haja muitos fãs, porque na minha altura era raro haver alguém que gostasse disto. Cresci pelo meio do gozo e do fazer-pouco, e assim pelo menos já não me sinto tão triste, sabendo que agora os miúdos já partilham mais os mesmos interesses. Quanto a desenhar, bolas isso assim não pode ser, que senão a concorrência é maior. Hehe, não, acho muito bem, só é pena que não sejam ainda mais, que este meio ainda está muito elitista e fechado. É preciso umas quantas chapadas de sangue fresco aos doutores que por aí andam. Isso e vestidos fofinhos.
E falando de outros artistas nacionais. Mantém contacto com outros artistas?
Mitsu: Sim, sim! Três dos meus colegas de banca são artistas, cada um com o seu estilo. Gosto bastante dos seus trabalhos são uma grande influência a nível de estilos. Tenho outros artistas nacionais de que gosto muito. Uma dessas artistas, a que mais acarinho, a Chikitta, mais conhecida como Chikorita85 no deviantart, tem trabalhos muito bons, simples e expressivos. Gosto muito do seu trabalho, vê-se que tem o estilo manga desde que nasceu.
Led: Para ser sincera, nem por isso. Posso contar com a Mitsu? Como eu disse na resposta anterior, o meio é muito elitista, e acaba por se tornar difícil encontrar alguém que esteja disposto a trocar ideias, ou no geral, ser simpático. Espero que com o lançamento do livro, possa mudar a minha opinião acerca deste assunto, aliás, anseio por isso. Acho que se fôssemos todos mais amigos, em vez de secretamente nos odiarmos uns aos outros, se calhar ainda aprendíamos algumas coisinhas.
Voltando livro, sei que a apresentação do 7 Cores de Oníris – A Grande Aventura foi feita na Feira do Livro de Lisboa e teve direito a uma versão em cosplay dos personagens. Qual foi a reacção das pessoas e qual tem sido o feedback em relação ao livro?
Mitsu: Sim, o cosplay foi muito divertido, tanto para nós como para quem nos viu. Foi engraçado ver a reacção do público, ora ficavam surpreendidas ora ficavam curiosos. Muito tiraram fotos e outros vieram visitar-nos e participar nas actividades. Estávamos em Oníris, não haja dúvida. Eu gosto muito de cosplay e achei a ideia gira, e pronto surgiu Oníris live-action. O cosplay em Portugal tem gerado muito interesse e é bom trabalharmos isso juntamente com o livro, pois enquadra-se no mundo do anime e manga. Em breve os personagens de Oníris estarão em mais eventos e espero que isso contribua para um sucesso do livro. Penso que o livro tem tido bom feedback, mas não sei ao certo, ainda é cedo para saber.
Led: As pessoas ficaram muito surpreendidas. Surgiu claro, a pergunta do costume “estão mascarados de quê?”, mas as pessoas mostraram-se muito recetivas a compreender, e as crianças riam-se e paravam os pais para verem melhor quem andava ali. Houve quem pedisse para tirar fotos connosco, atitude que, na minha opinião, é dos melhores feedbacks que se pode ter, apesar de eu não ter conseguido arranjar uma peruca jeitosinha a tempo como o resto das minhas colegas. Quem sabe, para o Amadora BD…
Em relação ao livro, ainda é cedo para o dizer. Só esteve até agora à venda na Feira, mas quando chegar às livrarias, espero poder responder a essa pergunta positivamente.
Para quem ainda não leu o vosso manga. O que diriam às pessoas para o lerem?
Mitsu: Leiam, LEIAM!! Vão divertir-se em grande! É um mundo a descobrir, cheio de mistério e aventura. Venham descobrir as 7 maravilhas de Onirís e os seus costumes. Dedicámos todo o nosso amor à criação deste maravilhoso mundo. Agarrem-no com ternura, como nós. Venham sentir as nossas alegrias em cada folha repleta de emoção. Lê-se num abrir e fechar de olhos e toda a família irá ficar maravilhada. Este livro ensina aos seus leitores o significado da verdadeira amizade entre pessoas de diferentes etnias, cor, língua e país.
Led: Leiam, por favor. Foi feito com muito carinho e muita persistência. Eu costumo dizer que é uma mistura entre «Os Cinco» e «O Senhor dos Anéis»… Lê-se bem, pois faz rir, faz chorar, diverte e está cheio de aventuras… E é ainda uma ótima prenda para os sobrinhos, netos, afilhados, no Natal, na Páscoa, nos anos… Portanto, não há motivos para deixar passar ao lado.
O livro fala sobre Oníris, um mundo original habitado por sete raças humanas, criadas pelos Íris (os sete jovens deuses gémeos). Ao criar a história de certeza que criaram maiores afinidade com uma ou outra raça. Qual é a vossa preferida?
Mitsu: Gosto de todas, todas são diferentes e têm a sua maneira de ser. Gosto de tudo o que é diverso, pois gosto de me apegar, não só a um tipo de pessoa, mas a vários. Ajuda-me a aprender e a crescer. Criarmos afinidade com todas as diferenças, aceitarmos todos, não um só, pois todos juntos somos um. Podemos ser diferentes, mas no fundo todos temos o mesmo “coração”. É difícil escolher pela raça em si, mas se for a escolher pelo design do personagem, ficaria pelos Zulis e pelos Sanguis. Cada raça tem um certo design para mostrar as diferenças de cada um. Os Zulis e os Sanguis são os designs que me chamaram mais a atenção. Mas, a nível de personalidade, gosto de todos. Ainda não sei que raça se enquadra na minha maneira de ser. Só a mestra Rita sabe 🙂
Led: Ainda estou em pé de guerra com a Rita Vilela para tentar descobrir, pois fiz o teste do nosso blog http://7oniris.blogspot.pt/, e dá-me que sou Verdi, mas eu gosto tanto mais dos Ruivis. Acho que sou uma mistura dos dois, gosto de ler, conhecer, saber, tal qual os Ruivis, mas quero estar descansada no meio do campo e dos bichinhos como os Verdis. Sou também gulosa como os Marelis, mas eles são muito altos, e eu sou baixinha. Sou um caso sério de conflito de personalidades.
Depois do manga de 7 Cores de Oníris, quais vão ser as vossas próximas grandes aventuras?
Mitsu: Ah ah Ah! Onirís ainda não terminou, já está em andamento! As aventuras serão mais divertidas e a acção mais fascinante! Neste próximo volume, espero mostrar mais detalhes deste mundo. Elaborar mais o desenho e as maravilhosas paisagens de Oníris. Que um dia venha a ilustrar mais projetos tão maravilhosos como este.
FIGHTING!!
Led: A próxima aventura já anda aí. Já estou neste momento a adaptar a história para o segundo volume da série, e espero não desiludir. Depois, passarei à ilustração, e com muitas figas, para o ano já temos o próximo. Entretanto, espero também poder ter outros projetos, e quem sabe, um emprego catita.
Querem deixar uma mensagem aos leitores do Clubotaku?
Mitsu : Muito Obrigada, Kamsaamnida! Espero que gostem do nosso livro, FIGHTING!!
E que o acompanhem aqui: http://7oniris.blogspot.pt/
Deixo-vos também o endereço do meu blog: mitsukuri.tumblr.com
Led: Minna, watashitachi no hon o yonde kudasai. Arigatou gozaimasu! (Pessoal, leiam o nosso livro por favor. Muito obrigado!)
Entrevista por: Fernando Ferreira