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Keiko, me wo sumasete

Como fã de boxe assumido que sou, o conteúdo relacionado com este desporto é sempre algo que desperta em mim alta curiosidade. Sendo um desporto bastante popular no Japão, há um sem número de obras dedicadas a este tema. Afastando-se das luzes da ribalta e com uma temática mais minimalista, Keiko, me wo sumasete, realizado por Shô Miyake, dá-nos uma perspetiva particular deste desporto através de uma protagonista surda.

Keiko Ogawa (Yukino Kishii) é uma empregada de hotel que se apaixona por praticar boxe. Indo a sua paixão para além de regulares treinos semanais, esta torna-se profissional e vai acumulando lutas contra adversárias próximas do seu nível. Sendo a sua surdez vista como algo impeditivo para a alta competição por parte de algumas academias, encontra num velho ginásio dirigido por Katsumi Sasaki (Tomokazu Miura) o apoio que necessita para alcançar os seus objectivos.

No entanto, passando-se a acção do filme em plena pandemia do COVID-19, os obstáculos com que os personagens do filme se deparam vão-se acumulando, seja a nível pessoal ou no esforço hercúleo que é necessário para manter o ginásio aberto.

Keiko, me wo sumasete é um filme bastante diferente de todas as obras que já vi sobre boxe. A abordagem feita à surdez da protagonista transporta-nos para o seu mundo, sendo um filme com poucos diálogos “falados”, optando antes pela linguagem gestual ou pela parca interação verbal de que as pessoas que rodeiam Keiko fazem uso. Assim sendo, há um grande foco na visão e ambiente, com as pessoas que rodeiam Keiko, especialmente as que trabalham no ginásio, a encontrarem forma inventivas de comunicar com esta nos treinos ou nos combates em que participa.

A família de Keiko, por outro lado, tem maior facilidade em falar com ela, mas dificuldades em perceber a escolha por um desporto que consideram violento. O foco dado à belíssima relação de mentor-pupila entre Katsumi e Keiko é também um dos pontos altos do filme, não sendo necessárias muitas palavras para demonstrar o sentimento de carinho e respeito que nutrem um pelo outro.

O uso da banda sonora é feito de forma minimalista, com uma escolha de faixas calmas que acompanham a vida da protagonista, sem nunca entrar no género de música inspiracional que é tão comum nas obras cinematográficas dedicadas ao boxe. A fotografia do filme, para além de fazer uso de uma belíssima palete de cores que destoa com muitas das obras mais “mainstream” de hoje em dia, foca-se muito nos detalhes do quotidiano da protagonista, o que leva o espectador a sentir uma maior proximidade com o mundo desta.

Fugindo de sentimentalismos que são um lugar comum em obras que têm como protagonista pessoas com surdez, Keiko, me wo sumasete (baseado no livro de memórias da protagonista), não é só inspirador por ser uma história de superação, mas também por mostrar que qualquer um de nós, independentemente da fortuna que nos calha na vida, tem capacidade para ter um moderado nível de sucesso naquilo que consideramos a nossa paixão.

Escrito por: Nuno Rocha

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