Desta vez trago um filme de um realizador Japonês chamado Toshiaki Toyoda, cujo tem por hábito não apenas realizar mas também ser o criador dos argumentos, conferindo um tom mais pessoal e original aos seus trabalhos.
Monsters Club (2012) começa com algumas imagens de uma floresta algures escondida entre Montanhas cobertas de neve, dando logo de início uma ideia de solidão e isolamento. Uma música de outras épocas, calma e melancólica, acompanha a câmara até entrarmos dentro de uma pequena cabana onde um homem trabalha delicadamente naquilo que parece ser uma bomba caseira. Seguindo numa sequência pouco usual percebemos que a bomba será enviada por correio até chegar ao seu último destinatário, o Presidente de uma qualquer empresa japonesa.
Ryoichi Kakiuchi (Eita) é um homem que decide isolar-se da Sociedade de forma a poder ser livre, fugindo às limitações que o Sistema impõe. Um Mundo onde ninguém é verdadeiramente livre, estando sempre dependente do outro, das decisões do outro e das vontades do outro. Um Mundo onde o trabalhador é escravo e o Patrão não possui qualquer autonomia.
Os seus dias vão passando sem grandes sobressaltos até que Ryoichi começa a ser visitado por um Shinigami (Deus da Morte) cujo acaba por lhe pedir que envie os seus pensamentos ao próprio Imperador, ameaçando uma ofensiva mais activa caso ele não oiça os seus pedidos.
Como se não bastasse, o protagonista é visitado pelos três irmãos relembrando os Três Espíritos do Natal Passado. A primeira visita é feita pelo irmão mais novo (morto num acidente de mota) que lhe fala do quanto ele não mudou desde o Passado. Algum tempo depois, a irmã (única parente viva) visita Ryoichi para lhe dizer que vai começar a trabalhar e que ele deveria seguir em frente numa vida menos pesada. Por fim, o irmão mais velho (que se suicidou naquela montanha após a morte do pai) tenta convencê-lo a deixar tudo, mostrando que o seu Futuro é ao lado da família no outro Mundo.
Após um longa e dura conversa com o irmão mais velho num sonho demasiado realístico, Ryoichi parece entrar num transe e acaba por pintar-se com as mesmas tintas com que vemos o Shinigami, levando-me a pensar que talvez a criatura nada mais fosse que um reflexo do monstro que vive dentro do personagem, num constante estado de confusão e desespero. Ele não sabe quem é, perdeu a sua identidade.
No dia seguinte, o protagonista abre a caixa destinada ao Imperador e troca os seus textos pelo poema Despedida de Kenji Miyazawa e, ainda com a cara pintada, vai até à cidade. Após se despedir da irmã, prepara-se para se libertar totalmente numa sequência verdadeiramente arrepiante que obriga o espectador a reavaliar a sua própria existência.
Há também que notar que durante o filme percebemos que os quatro irmãos possuem visões diferentes de liberdade. Kenta (o irmão mais novo interpretado por KenKen) sentia-se tão livre que vivia no extremo, acabando por morrer em consequência de uma condução irresponsável. Mikana (interpretada por Mayuu Kusakari) está farta de viver do dinheiro da herança do pai e começa a trabalhar para se sentir livre e independente. Finalmente, Yuki (Yosuke Kubozuka) percebe que a única forma de ser livre é entrando no outro mundo, acabando por se suicidar. É aliás este último que Ryoichi tenta imitar, de tal forma que o vemos a viver na cabana que Yuki construiu e (embora metaforicamente) durante o Inverno sendo que a palavra yuki pode também significar neve.
Na Fotografia, Toyotaro Shigemori opta por uma Fotografia escura dentro da Cabana talvez passando a ideia de monstruosidade e confusão mental em que vive o protagonista. Uma cabana que serve de palco não só ao fabrico de bombas mas também às longas visitas de espíritos e Shinigamis. No exterior, vemos morte: neve e escuridão, onde a única vida (sob a forma de um veado) é morta sem hesitação. Apenas as cenas da irmã trazem alguma luz, prenuncio do seu Futuro simples mas cheio de vida (aliás esta é a única personagem a usar roupas com cores vivas).
À semelhança de Like Someone in Love de Abbas Kiarostami, Monsters Club obriga-nos a repensar quem realmente somos e quem realmente queremos ser. Qual é a verdadeira designação de liberdade se é que esta existe realmente. Um filme que estreou em nove festivais de Cinema, entre eles o conceituado Toronto International Film Festival.
Escrito por: Ângela Costa