Koe to Kanachi começou por ser um one-shot da autoria de Yoshitoki OOima e evoluiu para uma história de 7 volumes, com direito a uma adaptação para filme de animação japonesa que sairá na temporada de outono deste ano.
Começamos por estar perante o protagonista Shouya, uma criança que só cria problemas, um delinquente. Com medo do aborrecimento que tudo à sua volta é, Shouya faz das mais variadas coisas como saltar de pontes, influenciando os seus amigos a juntar-se a ele em todo o tipo de problemas. Quando para a turma da primária entra Nishimiya Shouko, uma menina surda, Shouya vê uma oportunidade de acabar o seu aborrecimento. Nishimiya torna-se então um objecto para Shouya, desde a gritar-lhe aos ouvidos, mandar-lhe terra, deitar os aparelhos auditivos para a água, escrever barbaridades na mesa dela…
Esta parte inicial da história que é apresentada na one-shot, o que se pode dizer prólogo, e desenvolvida ao longo dos capítulos é de tal forma realista e cruel que criamos um ódio por Shouya por tudo o que ele é e pensa. Contudo a autora cria de forma excepcional a redenção de Shouya, quando a realização pelo mal que faz aparece e a sua vida se vira de pernas para o ar. Desenvolve um ódio por si mesmo e decide ser melhor pessoa, criando uma empatia para com os outros.
Todo o crescimento de Shouya é maravilhoso, deixa-nos na ideia a pergunta se somos capazes de mudar, principalmente quando nos deparamos com o mal que fazemos e com a humilhação que passamos. É a partir daqui que se começa a simpatizar com Shouya, afinal em criança nem sempre fomos bons e é com o crescimento que nos apercebemos disso.
A história não se foca em Nishimiya, pelo que não a desenvolve muito. Talvez na maneira em que o próprio Shouya não sabe muito sobre ela, mesmo tentando o possível por ser perdoado e compensar tudo o que fez. Nishimiya é a personagem em que é preciso ver detalhadamente as suas acções, expressões, gestos para a conseguirmos perceber e compreender. Sendo a única personagem que não usa palavras para se expressar, torna-se a personagem mais expressiva através de tudo o resto, sendo também a mais honesta. Afinal de contas a Voz tem várias formas.
Colocando-se também a questão de será que as vítimas perdoam?
Vamos também sendo apresentados com uma variada de personagens que são desenvolvidas realisticamente, tanto podemos gostar delas como no momento a seguir não, têm os seus defeitos e os seus dilemas sem os típicos traços de personagens fictícias. De maior relevância são as mães de Shouya e Nishimiya, com as suas diferentes formas de demonstrar o amor pelos seus filhos e as suas lutas para conseguirem o bem estar dos mesmos.
Uma história com grande qualidade artística. Cada personagem tem o seu estilo sendo cada uma única, todos os espaços e desenhos são bem detalhados com o que acho ser uma leitura agradável, com muitas poucas inconsistências e falhas para uma artista nova. Um excelente primeiro trabalho.
Somos imergidos numa luta psicológica sobre nós mesmo, num drama que poderia ser mais negro se a autora assim o entendesse, com uma psicologia profunda e um conto realista do dia a dia. Crescer não é fácil e estamos sempre a tempo de mudarmos quem somos e de nos tornarmos melhores seres enfrentando os nossos medos. Há que perceber que a primeira pessoa a ajudar-nos e a criar possibilidades para mudarmos só nós mesmos.
Escrito por: Vicky Duarte