Uma das particularidades do universo mangá no Japão é a abundância de estilos e temáticas, quase conseguindo satisfazer a velha máxima de «agradar a gregos e a troíanos», com mangas para todos os tipos de leitores e de todas as idades.
Com uma história densa e sofisticada, Sanctuary está inserido num estilo muito próprio de mangá que designamos por “Gegika” (nome específico que se dá às histórias com uma vertente mais realista, dramática e adulto). Publicada em 1990 na revista Big Comic Superior (edição Shogakukan), ao longo de doze volumes com enorme sucesso, a história de Sanctuary é um manga cheio de polémica onde diversos temas “adultos” são tratados com uma enorme frieza.
Akira Hojo e Chiaki Asami são dois amigos que cresceram em campos de refugiados no Camboja. Viveram no meio da miséria, ao ponto de terem que comer ratos para sobreviver e de enterrarem outras crianças que não resistiam ao inferno em que viviam. Fartos de toda esta situação decidem viajar para o Japão. Lá deparam com uma sociedade fútil, onde os jovens vivem sem grandes ideais e voltados à sociedade de consumo. Os dois juram transformar o Japão no seu santuário ideal e, para isso, seguem caminhos diferentes. Asami vai trabalhar na política e Hojo entra para a yakuza, a temida máfia japonesa.
Capaz de disparar sobre a cabeça de um rival com a mesma naturalidade com que seduz uma garota, Hojo torna-se num verdadeiro pesadelo para seus inimigos. Vestindo-se com elegância e sempre com o semblante tranqüilo, Hojo inspira tanto medo aos seus adversários quanto confiança e lealdade entre os seus subordinados. Entre eles, o violento “gangster” Tokai, que foi o primeiro a oferecer um emprego a Hojo e que depois tornou-se seu subalterno. Asami não fica atrás, agindo nos bastidores do parlamento japonês para revelar segredos de políticos e se beneficiar, com o sonho de chegar a ser Primeiro Ministro. Se necessário, também usa sua grande habilidade em artes marciais para forçar o cumprimento de seus objetivos.
No início da história, surge a bela oficial de polícia Kyoko Ishihara, que decide investigar o chefe Hojo e para isso prepara um audacioso plano. Insinuante, ela aproxima-se dele num bar, mas desmaia ao ingerir uma bebida com anestésico preparada pelo barman, um subdito de Hojo. Mais tarde, acorda nua numa cama de motel, com uma mancha vermelha entre as pernas. Imanginando na possibilidade de ter sido violada, decide ir ao hospital para fazer testes clínicos e saber toda a verdade. Ouve a notícia de que continua virgem (para espanto até da médica que a atendeu). Confusa, ela volta para o seu escritório, onde esperava um pequeno pacote oferecido por Hojo. Furiosa, ela jura vingança.
A arte do mangá é simplesmente fantástica e para os conhecedores reparamos que é a arte típica de Ikegami.
O traço transborda um realismo e um detalhe incrível suportada por uma história muito interessante e bem construída capaz de prender qualquer pessoa. Uma nota de curiosidade: os personagens políticos que vão aparecendo no mangá são bastante semelhantes com alguns dos políticos reais que na altura estávam no governo japonês. Talvez por isso o “design” de personagens seja bastante forte e intenso e que esta foi uma das razões para o enorme sucesso deste mangá.
Ao lermos Sanctuary descobrimos que este mangá vê o mundo político e “filosófico” de uma forma extrema mas que mesmo assim ainda existem alguns pontos interessantes a termos em conta. O mundo é comandado por pessoas com motivação e desejo de alcançar os seus sonhos, mas quando não têm sonhos, as pessoas caem e estagnam.
Criado pelo escritor Sho Fumimura e pelo manga-ka (pessoa que desenha o manga) Ryoichi Ikegami (autor também de Crying Freeman), este romance e drama, misturado com fortes imagens de sexo e violência é o resultado de uma obra sobre crime, ideais, corrupção, amor e solidariedade, voltada para adultos. A obra ainda inspirou uma animação para vídeo em 1995 e, mais tarde, dois longas em live-action, todos bastante elogiados.
Autor:Fernando Ferreira