Quem encontra o logotipo da Shochiku, diante de um Monte Fuji pintado em cores radiantes, dificilmente acredita que esse introduz um filme em que o mundo é ameaçado por um monstro gigantesco que cruza características de galinha e lagarto.
Contudo é isso que acontece em “The X From Outer Space” (no título original 宇宙大怪獣ギララ, leia-se Uchū Daikaijū Girara), produção de escasso orçamento levada a cabo pelos estúdios da Shochiku, que até aí deviam boa parte da sua fama e prestígio a dramas bastante respeitáveis (ocasionalmente realizados pelos mestres Kenji Mizoguchi e Yasujiro Ozu).
Tendo iniciado as suas funções enquanto companhia de teatro Kabuki, a Shochiku era um nome associado a cultura de categoria e eis que, em 1967, surge “The X From Outer Space” com uma premissa delirante (a de dar a Gojira o aspecto de um galináceo) e com recursos bem mais fracos que os usufruídos pelos estúdios Toho, na sua mais espectacular temporada.
Mas esta súbita aparição do terror e do fantástico, na linhagem da Shochiku, visava muito mais a criação de entretenimento de lucro fácil do que alcançar uma afirmação artística para ser levada a sério. Não deixam de ser bastante sérias as dores e os fantasmas atómicos que alimentam as narrativas deste período mais bizarro da Shochiku, porém os resultados verificados em filme hoje são pouco menos que hilariantes (apenas “The Living Skeleton” foge a essa regra ao ser mais comedido e atmosférico).
Reparemos por exemplo em como “Genocide” é uma deliciosa barafunda sci-fi do Japão pós-Hiroshima que envolve noções inacreditáveis sobre coisas tão diversas como a ciência, os traumas psicológicos e os perigos de um mundo entregue a idiotas. Talvez a melhor maneira de aproveitá-lo seja na galhofa com amigos e umas cervejas.
“Genocide” envolve a inevitável combinação “desastre ecológico e os seus efeitos imprevisíveis” (desta vez nos insectos) e, ao explorá-la, assemelha-se a um cortador elétrico que desbasta todas as regras de lógica por onde passa.A verdade é que é bastante divertido e apenas inferior a “The X that Came from Outer Space” (do mesmo realizador) nesta fase mais alucinada da Shochiku.
Merece mais culto.
Escrito por: Miguel Arsénio